Justiça deve definir caso de investidor da Petrobras
por CCHDC
A ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu que cabe à Justiça Federal, e não à arbitragem, analisar a disputa entre a Fundação Mudes, acionista minoritária da Petrobras, e a União. A discussão envolve o ressarcimento de cerca de R$ 40 bilhões à petroleira por prejuízos gerados com atos de corrupção que vieram à tona com a Operação Lava-Jato.
A definição é importante, entre outros aspectos, pelo fator tempo: uma disputa levada à arbitragem costuma ser resolvida mais rapidamente do que uma ação judicial. Com a decisão, o caso deverá ser julgado pela 22ª Vara Cível de São Paulo, ficando suspensa a arbitragem instalada em 2017 na Câmara de Arbitragem do Mercado (CAM), da B3.
O pedido de reparação de R$ 40 bilhões à Petrobras equivale às perdas decorrentes de corrupção — calculadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) — e de valores pagos para indenizar acionistas nos Estados Unidos.
A defesa da Mudes já recorreu e tentará levar a discussão à Corte Especial do STJ (CC 177437). Com a decisão monocrática (individual), Nancy Andrighi derrubou uma liminar concedida por ela própria em fevereiro. A decisão suspendia a ação na Justiça e elegia os árbitros para julgar medidas de urgência.
Entre outros argumentos, ela entendeu que a cláusula compromissória de arbitragem prevista no Estatuto Social da Petrobras não vincula a União. Considerou ainda que “a utilização da arbitragem não estaria autorizada na hipótese de eventual demanda sobre responsabilidade civil extracontratual em face da União”.
Em outro caso, a 2ª Seção do STJ já havia declarado a competência da Justiça Federal. Envolve investidores que querem ser indenizados pela União por prejuízos com a desvalorização das ações da Petrobras em decorrência da Lava-Jato (CC 151130). Nesse julgamento, de 2019, os ministros entenderam que a cláusula compromissória de arbitragem vincularia disputas entre a Petrobras e o controlador (a União), mas não entre acionistas.
Nancy Andrighi havia ficado vencida na ocasião. Entendeu que a disputa deveria ser julgada por arbitragem. Agora, aderiu à corrente majoritária. “A ministra reviu entendimento anterior nos autos do CC 151130 e passou a ser favorável à tese defendida pela União”, diz a Advocacia-Geral da União (AGU) em nota enviada ao Valor.
A defesa da Fundação Mudes, contudo, sustenta que o seu caso é diferente do decidido pela 2ª Seção. Isso porque a ação, afirma, é baseada no artigo 246 da Lei das Sociedades Anônimas, que permite a minoritários pedirem, em nome da companhia, reparação ao controlador por prejuízos.
A Fundação Mudes alega que a União usou do seu poder de voto para indicar diretores que praticaram atos de corrupção na Petrobras, conforme delações premiadas de executivos e políticos na Operação Lava-Jato.
Em caso de outro investidor que pede, em nome da empresa, reparação para a Petrobras, a ministra Nancy Andrighi determinou a interrupção do processo que corre na 1ª Vara Federal do Rio de Janeiro e a continuidade da arbitragem instalada na CAM.
Fabiano Robalinho, advogado do acionista, afirma que a cláusula arbitral foi incluída no Estatuto da Petrobras em 2003, por iniciativa e com voto favorável da União na assembleia geral de acionistas. “É um absurdo a União representar para acionistas. “É um absurdo a União representar para acionistas que está vinculada à cláusula como símbolo de boa governança e negar a vinculação quando a disputa surge”, diz o sócio do escritório Sergio Bermudes Advogados.
Para o advogado Guilherme Setoguti, do Monteiro de Castro Setoguti Advogados, a nova decisão da ministra Nancy Andrighi impacta o mercado de arbitragem. “A remessa dos processos à Justiça Federal não significa que não poderá haver a condenação da União, mas a mudança representa pelo menos um retrocesso de tempo nas ações movidas por esses investidores”, afirma.
Fonte: Valor Econômico