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8 de dezembro de 2022

Propaganda enganosa: qual é o limite do direito do consumidor?

por CCHDC

Não raro ocorre do consumidor se deparar com ofertas de produtos e/ou serviços com valores muito menores do que aqueles praticados no mercado, em conflito com seu real valor.

Por vezes, tal anúncio é de fato verdadeiro, fruto de campanha promocional de grandes lojas ou mesmo de pequenos comerciantes, visando, por exemplo, eliminar estoque de produtos que não tiveram a venda esperada, diminuindo seu capital imobilizado.

Em outras oportunidades, tais ofertas decorrem de má-fé do empresário/fornecedor que, buscando atrair o cliente, divulga anúncio aparentemente vantajoso, porém, quando o consumidor busca efetivar a compra, é surpreendido com outro valor ou condições de pagamento muito diferentes daquelas anunciadas.

 

Nessas situações, o Código de Defesa do Consumidor dispõe em seu artigo 6º sobre a proteção do consumidor contra a propaganda enganosa, definindo-a em seu artigo 37:

 

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

. . .

IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

 

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

  • 1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.

 

Assim, uma vez que seja constatada a má-fé do anunciante, visando ludibriar o consumidor e atraindo-o a uma venda que no momento de sua efetivação revela-se diferente daquela pelo qual ele se interessou, estamos diante de propaganda enganosa, devendo o fornecedor/anunciante fazer valer sua oferta inicial.

 

Nesse sentido, os artigos 30 e 31 do Código de Defesa do Consumidor obrigam o comerciante/empresário à oferta estipulada, bem como ao dever de que tais ofertas sejam claras e precisas, senão vejamos:

 

Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.

 

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

 

Assim, o desrespeito aos comandos legais acima elencados, além de sujeitar o fornecedor à vinculação de sua oferta, também caracterizam infração penal, conforme definição do artigo 67 do mesmo diploma legal, que assim dispõe?

 

Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva:

Pena Detenção de três meses a um ano e multa.

 

Dessa forma, é de suma importância que o fornecedor tenha todos os cuidados na estipulação de eventual oferta/proposta, efetivando-a de forma clara e precisa, sob pena de não o fazendo incorrer na obrigação de cumprimento da proposta, além de penalização criminal por tal fato.

 

Do erro na oferta de produto e a proteção do fornecedor

 

Diferentemente da propaganda enganosa, há outras situações em que, por erro involuntário do fornecedor/anunciante, determinado produto ou serviço é anunciado equivocadamente por valor substancialmente inferior ao de mercado. Nessas situações, estamos diante de erro crasso na vinculação da oferta/proposta.

 

Nos primeiros anos de vigência do Código de Defesa do Consumidor, havia a interpretação, seguida por boa parte da jurisprudência, de que inobstante tratar-se de claro equívoco no anúncio publicado, ainda que não houvesse má-fé, deveria o anunciante cumprir a oferta proposta.

 

Assim, por exemplo, se o preço de mercado de determinado produto fosse R$ 1.000,00 (mil reais), e o anúncio publicado incorretamente o ofertasse por R$ 100,00 (cem reais), o anunciante era obrigado a vendê-lo por este último valor, sob pena de infração às normas do Código de Defesa do Consumidor.

 

Com o passar dos anos tal entendimento foi sendo mitigado e abrandado tanto pela jurisprudência, quanto pela doutrina.

 

Isso porque, por vezes, não há má-fé alguma do fornecedor/anunciante e tampouco intenção de ludibriar o consumidor, mas apenas a ocorrência clara de erro grosseiro e involuntário.

 

Nesse sentido, a força vinculante prevista no artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor é mitigada, por tratar-se de erro escusável, não vinculando o fornecedor. Se o produto é ofertado por preço vil, em que é plenamente possível ao consumidor o entendimento de tal situação, não pode este exigir a venda nos moldes anunciados.

 

Sendo assim, a boa-fé que a lei exige do fornecedor também deve ser exigida do consumidor. Dessa forma, constatado o equívoco claro em informação ou publicidade, não se pode consentir na vinculação obrigacional do fornecedor, almejada pelo consumidor com o claro propósito do enriquecimento ilícito.

 

Portanto, o entendimento atual é no sentido de que o consumidor não pode pretender obter vantagem em razão de equívoco evidente do fornecedor, mesmo que este seja a parte mais forte da relação. Isso porque a força vinculante de oferta claramente feita de forma equivocada, não pode se sobrepor a princípios basilares de nosso ordenamento jurídico, como a boa-fé objetiva, o não enriquecimento sem causa, a lealdade, dentre outros.

 

Sobre o tema, o Professor consumerista Rizzatto Nunes, nos leciona:

 

. . . pode o fornecedor recusar a oferta, porque o erro é grosseiro, flagrante, não havendo vinculação do fornecedor quando a oferta é evidentemente falha, contrariando qualquer padrão regular e usual do preço de venda do produto daquele tipo.

(…)

Dois dos princípios sobre os quais está fundada a relação jurídica de consumo são a boa-fé e o equilíbrio. Eles são pressupostos de toda relação estabelecida. Seria impossível propugnar por uma relação jurídica, na qual o bom senso não imperasse e se quisesse fundá-la nos princípios da boa-fé e do equilíbrio.

 

Em resumo, o consumidor, ao se deparar com uma propaganda ofertando determinado produto por preço muito inferior ao de mercado, deve buscar a compreensão, refletindo se trata de mero erro não intencional promovido por fornecedor sem histórico de tal conduta ou se configura propaganda que tem por intuito ludibriar o consumidor, induzindo-o ao erro, para provocar compra de forma enganosa.

 

Feitas as considerações acima, é imprescindível que o fornecedor sempre busque atender às disposições presentes no Código de Defesa do Consumidor, principalmente em relação à clareza e detalhamento na oferta anunciada, evitando propagandas duvidosas que possam levar ou induzir o consumidor a erro, sob pena de obrigação ao cumprimento da proposta, exceto quando tratar-se de evidente erro grosseiro/material e não intencional.

 

Comentários ao Código de Defesa do Consumidor”, Arnaldo Rizzatto Nunes, 8ª ed., Saraiva: São Paulo, 2014, p. 480.

 

Autores:

Mauricio Dellova de Campos
[email protected]

Isabela Cristina de Faria
[email protected]

Antonio Tomasillo
[email protected]

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