Artigos

Home  »   Publicações  »   Artigos  »  Garantidores contratuais e a recuperação judicial: a responsabilidade e sub-rogação de direitos
21 de setembro de 2023

Garantidores contratuais e a recuperação judicial: a responsabilidade e sub-rogação de direitos

por CCHDC

É comum os sócios das empresas assumirem a posição de garantidores, para obtenção de crédito junto às instituições financeiras e outros fornecedores específicos. Porém, quando a empresa avalizada entra em regime de recuperação judicial, surgem as dúvidas: a instituição financeira fica impedida de cobrar a dívida? Ela pode cobrar a dívida integral? O garantidor pode cobrar a empresa em recuperação judicial, caso pague a dívida, em vista da sub-rogação dos direitos de crédito? São essas questões que pairam quando a empresa entra em um processo de solvência, e que se pretende dirimir nesse artigo.

Recuperação judicial não impede a cobrança da dívida

Após muito debate, o Superior Tribunal de Justiça, responsável por uniformizar a intepretação da lei infraconstitucional, consolidou o entendimento de que a recuperação judicial da empresa avalizada não obsta a cobrança da dívida dos garantidores:

Súmula 581: A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória¹.

Há única exceção é na hipótese de o plano de recuperação judicial homologado pelo Juízo da recuperação judicial, cumulativamente: I-) prever a liberação das garantias; e II-) o credor detentor da garantia expressamente concordar com o plano, conforme previsto no art. 50, §1º, Lei 11.101/2005 (LREF)².

Assim, em regra, todo e qualquer concedente de crédito garantido pode executar os garantidores mesmo que o crédito executado esteja submetido à recuperação judicial da empresa avalizada. A exceção é na hipótese de o plano de recuperação judicial prever a liberação das garantias e o credor concordar expressamente com o plano.

 

O valor cobrado dos garantidores

Apesar de a obrigação do garantidor (pessoa física) não ser diretamente afetada pela recuperação judicial, certos fatos podem alterar os parâmetros da cobrança, em especial o pagamento, pois o credor não pode receber duas vezes o mesmo crédito.

A hipótese mais comum é a de que, pelo plano de pagamento dos credores submetidos ao processo de recuperação judicial, o pagamento dos créditos se dê forma distinta da dívida original, com aplicação de deságios, índices de correção e juros mais baixos; e mesmo que a empresa cumpra integralmente o plano, os garantidores ainda poderão responder pela diferença entre o valor da dívida originária e o valor da dívida quitada pela empresa em recuperação judicial.

Outra situação recorrente é que, ainda que a empresa – devedora principal – esteja sob o regime da recuperação judicial, os credores titulares de créditos avalizados pelos sócios – pessoas físicas – promovem a cobrança do crédito na sua integralidade concomitante ao processo de insolvência, o que é permitido pela Súmula 581 do STJ.

Portanto, ainda que o plano de recuperação judicial não interfira diretamente nas obrigações do garantidor, é necessário estar atento às condições aprovadas e ao seu cumprimento, em especial em relação aos pagamentos realizados pela empresa recuperanda, uma vez que é ilícito o recebimento integral do mesmo crédito por duas vezes.

A situação dos garantidores perante a empresa em recuperação judicial: sub-rogação

Paga a dívida, total ou parcial, pelo garantidor, ele poderá cobrar a empresa em recuperação judicial, pela incidência, no caso, da sub-rogação aos direitos do crédito. O ponto de atenção nessa situação é a proporção da dívida em que poderá se sub-rogar.

Na hipótese de existir solidariedade pela dívida, situação em que duas partes podem ser cobradas integralmente por uma obrigação, o pagamento integral da dívida por um deles gera o direito ao ressarcimento da quota-parte que era devida pelo outro devedor, conforme prevê o art. 283 do Código Civil (CC/02).

No caso de subsidiariedade na dívida, situação em que a obrigação somente será cobrada do garantidor caso o garantido não cumpra no prazo convencionado, o pagamento pelo garantidor o coloca na posição do credor originário, a chamada sub-rogação, podendo buscar o ressarcimento nas mesmas condições do pagamento por ele realizado.

Portanto, verifica-se que, embora a recuperação judicial não obste a execução da dívida em face dos garantidores, ela pode interferir diretamente nos parâmetros da cobrança. Como exposto, em regra, o concedente do crédito pode executar os garantidores, mesmo que o crédito executado esteja submetido à recuperação judicial da empresa avalizada, salvo quando o plano de recuperação judicial prever a liberação das garantias e o credor concordar expressamente com o plano.

Além disso, ainda que o plano de recuperação judicial não interfira diretamente nas obrigações do garantidor, é necessário estar atento às condições aprovadas e ao seu cumprimento, em especial em relação aos pagamentos realizados pela empresa recuperanda, uma vez que é ilícito o recebimento integral do mesmo crédito duas vezes.

Por fim, o pagamento da dívida pelo garantidor autoriza a busca pelo ressarcimento em face da empresa em recuperação judicial. O ponto de atenção nessa situação é a proporção da dívida que poderá ser cobrada: em caso de solidariedade, há o direito ao ressarcimento da quota-parte que era devida pelo outro devedor; no caso de subsidiariedade, o garantidor pode buscar o ressarcimento pela integralidade da dívida paga, nas mesmas condições do credor originário.

 


¹ SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/09/2016, DJe 19/09/2016.

² Lei 11.101/2005. Art. 50, §1° Na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia.

Autores:

Fernando Castellani
[email protected]

Márcia Ferreira Ventosa
[email protected]

Thaís Vilela Oliveira Santos
[email protected]

Arthur Santos Gonçalves
[email protected]

Deixe um comentário:

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *